sábado, 17 de outubro de 2009

FÁTIMA CAMPOS, a autarca da muito alta tensão

Enfrenta o PS, o partido por que foi eleita, e o GovernoFátima Campos, a autarca da muito alta tensão 09.03.2008 - 07h00 Paulo Miguel MadeiraÉ uma mulher de atitude determinada e sem hesitações que se senta à secretária e começa a falar sobre o processo contra a linha de transporte de electricidade em muito alta tensão da REN entre Fanhões e Trajouce, de que se tornou o rosto no país. Uma junta de freguesia obrigou uma poderosa empresa nacional, cujo presidente participou na elaboração do programa do Governo, a fazer o que não queria — desligar, para já, aquela linha — e antecipou um movimento que se espalhou a vários pontos do país e assumiu proporções nacionais.
Fátima Campos, eleita pelo PS, preside à Junta de Freguesia de Monte Abraão, no concelho de Sintra, que em nome da saúde pública processou a REN-Redes Energéticas Nacionais por ter posto a funcionar uma linha, de mais de 20 km, que não entra no território da sua freguesia mas passa a poucas dezenas de metros de alguns dos seus edifícios residenciais. De caminho, foi também processado o Ministério da Economia, por ter licenciado a sua instalação.
No final de Novembro de 2006, a autarca, com 14 anos de experiência, recebeu um telefonema que iria marcar os seus meses seguintes e obrigar a mobilizar energias. Uma moradora alertava para que, junto à Anta de Monte Abraão, monumento nacional, estava a ser criado um estaleiro. Procedia-se à colocação de manilhas, pacotes de cimento, havia muitos camiões. Fátima Campos constatou no local o que se passava, disseram-lhe que era o estaleiro para a instalação de uma linha de muito alta tensão e contactou logo a Câmara de Sintra, que embargou a obra.
“Era a única coisa que a câmara podia fazer relativamente a embargos, porque não tem poder para embargar uma obra daquelas”, uma linha eléctrica, conta. “Eles construíram o estaleiro noutro local e começaram a abrir umas crateras para instalar os postes. Entretanto um funcionário ia lá todos os dias tirar fotografias. Quiseram agredi-lo.” A junta moveu logo uma primeira providência cautelar, para a obra não continuar. Esteve parada durante um mês mas o Tribunal de Sintra não lhe deu razão e a obra recomeçou. “Aceleradamente”, conta Fátima Campos. “Se todas as obras no nosso país fossem àquele ritmo, estávamos nós lindamente.”
O segundo momento que acendeu a sua determinação aconteceu na Assembleia Municipal de Sintra, já em 2007. Os moradores foram lá às centenas, com “algumas mães até a chorar”. A Junta de Monte Abraão já tinha perdido a terceira providência cautelar junto do Tribunal de Sintra. Havia mães a dizer que se sentiam culpadas por terem comprado casas naqueles locais, apesar de só depois os postes de muito alta tensão terem sido erguidos. Receavam pela saúde dos filhos. “Imploravam: senhor presidente da câmara [Fernando Seara, social-democrata], faça alguma coisa por nós. E o sr. presidente estava de cabeça baixa, a trocar os dedos, e assim continuava, a trocar os dedos, e assim continuava, nem se dignava responder.”
“Pedi logo a palavra e exigi que ele respondesse. E ele respondia-me a mim, furioso: ‘Olhe, peça lá ao Zé’, referindo-se ao primeiro-ministro, ‘a sra. deputada, que é do mesmo partido dele, que faça uma lei para que as câmaras municipais tenham o poder de embargar essas obras’. E eu respondi-lhe: ‘Ó sr. presidente, se está habituado a que no seu partido se use desse amiguismo e compadrio, no meu não há isso e eu nunca faria uma coisa dessas. Estou sempre dentro das minhas competências e não digo: ‘Diga lá ao Zé’.”
Esta cena e o facto de, enquanto deputada municipal, ter alertado os deputados dos vários partidos, o presidente da câmara, os vereadores, o presidente da Assembleia Municipal (o social-democrata Ângelo Correia) e ninguém reagir indignaram-na. Durante cerca de um ano, os moradores e uma associação cívica entretanto criada dirigiam-se à Assembleia Municipal com o assunto, empunhando cartazes. Havia muita gente a querer falar e as regras de uso da palavra foram alteradas. “É triste”, diz Fátima Campos.
Foi à luta isolada. A Junta de Monte Abraão decidiu unanimemente avançar com o processo, com voto por unanimidade também da Assembleia de Freguesia, onde estão representantes de todos os partidos parlamentares. Começa a aprovar moções dirigidas ao Presidente da República, ao primeiro-ministro, à Câmara Municipal, à Assembleia Municipal. “E ninguém fazia nada.” Até que os advogados da junta entenderam pedir uma nova providência cautelar ao Tribunal Administrativo Central do Sul, que pela primeira vez lhe deu razão e mandou desligar a linha. A REN foi recorrendo e perdeu, inclusive no Tribunal Constitucional. A linha está desligada desde Dezembro. A acção principal corre no Tribunal de Sintra.
Solitária e orgulhosa
Fátima Campos está orgulhosa, “muito orgulhosa”, pelo que já conseguiu e por a linha estar desligada, e continua com “muita esperança” num desfecho favorável às suas pretensões. Entretanto chegou algum reconhecimento, na comunicação social. A revista “Lux” distinguiu-a (após votação dos leitores em três nomes pré-seleccionados por um júri) como mulher do ano na política em 2007, devido ao trabalho em defesa dos interesses da população. E o “Diário de Notícias” escolheu-a em Dezembro como figura feminina de 2007 (a figura masculina foi o presidente da ASAE) pelo mesmo motivo.
P. — Tem a noção de que se tornou numa figura nacional?
R. — Por uma boa razão. E fico orgulhosa exactamente por ter sido esta a razão.
P. — E o que é que a move neste caso? Já falou na saúde pública...
R. — Em qualquer decisão da minha vida, mesmo da minha vida particular, ponho-me sempre no papel das outras pessoas. Das pessoas que estão a ser atingidas por qualquer situação. E digo sempre isso aos meus filhos, aos meus netos, às minhas funcionárias, a toda a gente: “Ponham-se no papel da outra pessoa. Gostavam que isso fosse feito dessa forma?” Pus-me na pele daquelas pessoas que moram com aquele poste de 75 metros à frente da sua varanda, que ouvem aquele ruído contínuo, todo o dia, que vêem aquelas faíscas à noite. E em dias de nevoeiro e chuva o barulho piora.
Ainda hoje, a Junta de Monte Abraão está, do ponto de vista institucional, sozinha nesta luta, apesar já ter surgido contestação às linhas de muito alta tensão também em Silves e de a Câmara de Almada ter decidido não afectar terrenos públicos para a REN concluir uma linha deste tipo entre Fernão Ferro e a Trafaria. Na Batalha, dezenas de habitantes de Celeiro manifestaram-se contra a prevista passagem nas proximidades da linha de muito alta tensão Batalha-Lavos.
A contestação também chegou ao Norte. Em Paredes, um grupo de moradores da Rebordosa ameaçou, já no final do mês passado, processar a REN pela instalação numa área residencial de sete postes de uma linha de muito alta tensão entre a Régua a Vermoim, na Maia. E em Serzedelo, no concelho de Guimarães, são aguardados os resultados de um estudo epidemiológico da Administração Regional de Saúde do Norte, com vista a tentar esclarecer se há relação entre o historial de doenças oncológicas da população e os campos electromagnéticos gerados pelos cabos de alta e muito alta tensão que se espalham pela freguesia. “Continuo sozinha. Só tenho a população”, diz Fátima Campos.
Nasceu em Luanda, em “berço de ouro”, segundo conta. Há 50 anos, a sua mãe, radiologista, já conduzia. O pai era industrial. Frequentou colégios de freiras e estudou Assessoria de Direcção, nos ISLA. Casou-se com um engenheiro, mas divorciou-se aos 30 anos. “Não nos entendíamos.” Mas ele morreu pouco depois, e Fátima criou os filhos sozinha.
Diz que isto é da sua maneira de ser, que é muito de convicções. “Lembro-me de dizer muitas vezes, pequeníssima, com dez anos: mas se for um louco a governar-nos, temos de estar sujeitos à opinião de um louco? Eu não me estava a referir a ninguém, porque não percebia nada de política.” A mãe, que faleceu há três anos, lembrava-lhe estes episódios de Luanda, onde cresceu. E diz que até lhe provarem o contrário não cede e que é teimosa. “Se é que isto é ser teimosa.” Mas neste caso ainda ninguém lhe provou que estivesse errada e afirma-se disposta a ir até à última instância, “até ao Tribunal Europeu se necessário for”.
“Sem certezas, devemos ter precauções”
Mas afinal que riscos podem advir para a saúde em resultado da exposição aos campos electromagnéticos gerados pelas linhas de distribuição de electricidade? A situação parece ser: sabe-se que há dano, mas não se sabe em que extensão. “Ora, se não há certezas devemos ter precauções”, atira, peremptória, a presidente da Junta de Monte Abraão.
“Foi o que o colectivo de juízes do Tribunal Central Administrativo do Sul disse”, acrescenta. Diz que só agora os estudos estão a começar e que só daqui a dez anos haverá resultados mais conclusivos.
Em Agosto do ano passado, soube-se que um relatório de um grupo de trabalho nomeado pelo Governo para avaliar os efeitos da exposição da população a campos electromagnéticos detectou a existência de riscos para a saúde. Um dos aspectos nele criticados é justamente a falta de informação sobre o assunto. Foi concluído em 2003 e a Direcção-Geral de Saúde publicou-o só naquela altura, recomendando restrições ao uso de telemóveis por crianças.
O estudo reporta-se a fontes de radiação como linhas de alta tensão, antenas de telemóvel, rádio e televisão, e diz que hoje “as radiações [não ionizantes] são omnipresentes” e “não existe um risco zero”. E a dado ponto refere mesmo a possibilidade de uma intensa exposição aos campos electromagnéticos aumentar ligeiramente os riscos de leucemia infantil e tumores cerebrais nos adultos nos locais de trabalho.
A REN diz por seu lado que cumpre escrupulosamente a lei e que “os valores em vigor têm em conta os princípios de precaução definidos pela OMS”. Declaração feita por “e-mail” pelo director de comunicação da REN, Artur Lourenço: “De acordo com os dados de projecto para a Linha FanhõesTrajouce, à distância de 30 metros, a 1,80 metros do solo, os valores expectáveis para o campo eléctrico são de 0,1 kV/m e para o campo magnético de 1 µT (para a carga máxima que nunca será atingida, excepto nalgum raro incidente em que as outras duas linhas se avariassem em simultâneo; notese que cada linha, em regime normal, não deve transmitir mais do que um terço da sua carga nominal para que possa sair de serviço sem que os consumidores se apercebam).”
Antes, Artur Lourenço tinha dito, por telefone, que medições de uma empresa holandesa, feitas com a linha a funcionar com uma carga de 20 a 25 por cento, permitiam extrapolar um valor de 15 µT para o seu funcionamento com carga máxima. As habitações mais próximas da linha encontram-se a uma distância de 30 metros, também segundo a informação da REN.
Sobre os efeitos da exposição prolongada na saúde, parece que nada de muito concreto se sabe. Entre as recomendações da OMS incluídas num documento que a REN tem no seu “site” está a de que “o Governo e a indústria devem promover programas de investigação para reduzir a incerteza da evidência científica quanto ao efeito da exposição crónica aos campos electromagnéticos nos sistemas biológicos e na saúde”. Diz-se também que “65 por cento dos cidadãos europeus não estão satisfeitos com o nível e qualidade de informação” sobre estes campos e que na lei “está estabelecida uma norma destinada a uma protecção cautelar a um eventual risco que, até à presente data, não é conhecido”.
Mas, no mesmo documento, considera-se adequada a legislação nacional sobre o controlo e monitorização da exposição do público em geral, designadamente a recomendação de valores de referência de 5 kV para valor máximo de campo eléctrico e 100 µT para valor máximo de campo magnético.
Mulher de desafios
O gosto por desafios é uma das características assumidas por Fátima Campos. Diz mesmo que gosta “muito”. Criar sozinha três filhos “não foi fácil”. “Dei um curso superior aos três, já são casados, já tenho netos, nunca me deram problemas. Isso já foi um desafio. E eu era muito nova. Tive o primeiro filho com 20 anos.” Hoje ainda os vê como miúdos, mesmo à filha mais velha, que está com 36.
Naquela altura não estava em Lisboa, estava em Santo André, no Alentejo, porque trabalhava no Gabinete da Área de Sines como assessora da administração. Diz que sempre foi assim na vida, “muito lutadora”, e que, quando as pessoas se dirigem à junta a pedir-lhe ajuda, diz-lhes muitas vezes: “Mas vocês também têm de lutar.”
A mulher de ar bem tratado e seguro, que se projectou para o espaço mediático nacional, chega a perturbar quando dispara: “Eu cheguei a passar fome.” Ficou desempregada quando foi extinto o Gabinete da Área de Sines, criado em 1971 para gerir a instalação do pólo petroquímico local. “E eu não tinha 30 anos. Depois, quando fiquei sozinha com os meus filhos, eu não tinha ordenado, tinha de pagar a renda de casa em Santo André, perto de Sines, e não tinha dinheiro.”
Agradece aos vizinhos que tinha na altura a ajuda que recebeu, porque não pedia nada a ninguém nem dava a conhecer à família a situação em que estava. Veio procurar emprego para Lisboa e ficou na TAP, onde foi assessora nas áreas financeiras e comercial. “Trabalhava dia, noite, fins-de-semana, prescindia das férias, para ganhar mais ordenado. Tinha o ordenado normal, mais um mês por estar a trabalhar e tinha o subsídio de férias. Para criar os meus filhos.”
Deixou esse emprego para vir para a junta, a “ganhar muito menos”. Porquê? “Gosto muito de ter poder para poder ajudar os outros.” Diz que nunca ligou muito à parte material da vida, “talvez por ser muito de convicções”. E acredita que “pode ajudar a mudar o mundo”. Também chora, quando lhe aparecem na junta pessoas em situações desesperadas a pedir ajuda.
Nunca esteve doente, excepto quando estava em Luanda. Hoje, diz que ter superado dificuldades lhe deu força. E também a noção de que somos todos iguais, homens ou mulheres. “Os homens talvez tenham mais força física do que eu, mulher. Mas anímica, não têm. Eu tenho bastante mais força do que muitos homens que conheço.”
O ambiente onde cresceu também ajudou? “Talvez. Em Luanda éramos muito diferentes das pessoas de cá.” A mãe nasceu em Casablanca, filha de algarvios, e foi para Luanda nos anos 1940, e o pai, falecido há dois meses, nasceu já na capital angolana, filho de poveiros. Lá se conheceram e lá se casaram. Fátima, os seus irmãos e as filhas nasceram em Luanda.
“Havia muita solidariedade. Entrávamos uns nas casas dos outros, éramos pessoas muito mais alegres, muito mais solidárias. E eu ainda não perdi esse comportamento.” Foi educada com muita independência, participou em manifestações enquanto estudante mas diz que nunca sentiu a PIDE ou Salazar. “Eu vivi da mesma maneira como vivo hoje. Nunca senti nada disso.”
Queixas de ruído e pesquisas na Net
Quando o processo contra a linha de muito alta tensão avançou, as queixas concretas dos moradores eram relativas ao ruído e a faíscas. E já vinham de antes da existência desta linha. É que naquela zona passa quase paralela uma outra linha, de alta tensão, há 17 anos, assegurando o fornecimento de electricidade a esta zona da periferia de Lisboa, e que funciona a metade da sua capacidade, conta Fátima Campos. A nova linha de muito alta tensão foi construída para suporte, no caso de a outra falhar, não sendo ainda necessária para o abastecimento às populações.
As pessoas que vivem perto das linhas já se queixavam do barulho antes da construção da nova, mas sem resultado. Perguntavam à presidente da junta se já se tinham informado do mal que aquilo podia causar, mas Fátima Campos “não tinha a mínima noção”. E só levou “mais a peito o problema” quando viu instalar os postes de muito alta tensão. “Foi quando comecei a estudar, a procurar na Internet, etc. Algumas pessoas mandavam-me também vários estudos.” Os moradores mais próximos queixavam-se de ouvir também o barulho da nova linha, além do da anterior. E com humidade atmosférica tudo piorava.
Pediu também um parecer ao Instituto de Oncologia. “Veio bastante cauteloso, mas dizendo que a maior parte das crianças que lá tinham viviam perto destas linhas de muito alta tensão.” Diz que a Junta de Monte Abraão tem tudo a seu favor e que a REN só tem a seu favor ter cumprido a lei.
Entretanto houve o episódio da medição da intensidade do campo electromagnético gerado pela nova linha. Feita por uma empresa contratada pela REN com a linha a funcionar a cerca de 25 por cento da capacidade máxima, a 1,8m do solo, foi contestada pela junta. Os advogados pediram medições no interior das casas das pessoas nos andares elevados mais próximos da linha.
Foram também feitas experiências com lâmpadas fluorescentes. Fátima Campos conta que foram postas debaixo da linha e acendiam sozinhas. E que nas casas que estão mais próximas da linha também acendem sozinhas, sem ser preciso carregar no interruptor. A REN disse ao PÚBLICO que “no interior de uma casa o campo eléctrico deve ser nulo. Mesmo uma simples parede de alvenaria é, normalmente, suficiente para o ‘blindar’”. Daí que “estranhe o caso das lâmpadas fluorescentes dentro de casa ficarem brilhantes. Teria de ser visto e a REN está disponível para estudar o caso desde que lhe indiquem o local e facultem os respectivos acessos”.
Fátima Campos sente a freguesia de Monte Abraão como uma filha, pois preside à junta desde que foi criada, em 1997. Antes fazia parte da junta de Queluz, a freguesia que nesse ano foi dividida em três, dando origem à de Monte Abraão e Massamá, mantendo-se a de Queluz. Está no terceiro mandato e tenciona concorrer ao quarto e, no fim, reformar-se. Diz que seria uma traição concorrer por Queluz ou Massamá, como já lhe pediram.
Estima que a freguesia esteja agora com cerca de 45 mil habitantes, o que é mais do que a maioria dos concelhos do país, e que metade sejam imigrantes, pelo movimento que tem na junta.
Enfrentar o próprio partido
As possíveis consequências políticas desta iniciativa não assustaram a autarca. “Normalmente sou muito impulsiva. Não pensei que era do Partido Socialista. Fosse quem fosse. Fi-lo, e nunca reconsiderei nem me arrependi. Fá-lo-ia exactamente da mesma forma.”
Fátima Campos também sabia que o presidente da REN, José Penedos, é uma pessoa com peso no PS. Foi co-autor da moção que José Sócrates apresentou ao Congresso do PS em que foi eleito secretário-geral, colaborou na elaboração do programa do actual Governo e foi secretário de Estado de António Guterres. Enfrentou-o e ficou mal impressionada: “Eu nunca reuni com ele, ele nunca falou comigo. Mas o que eu sabia através da comunicação social era de uma prepotência a toda a prova, o que me indignava também. Tanto que, não sei se foi por acaso ou não, o senhor entretanto foi afastado de prestar declarações. Porque as coisas que ele dizia eram de bradar aos céus. Era surreal.”
Nunca foi pressionada pelo partido ao longo deste processo, mas sentiu que assustou muita gente. Diz que se tivesse sentido pressões daria conhecimento ao país e poderia eventualmente sair do partido. Mas “nunca abandonaria este processo”. Não teve apoios de ninguém, mas recebeu os parabéns de várias pessoas, “a nível concelhio, a nível nacional, pessoas de alto gabarito do PS”, por ter ganho a primeira fase do processo, por ter encetado esta luta. Mas ninguém deu a cara publicamente pela causa.
P. — E já pensou em exercer outras funções?
R. — Nunca. Assustei foi muita gente, inclusive do meu partido. Querem ver que a fulana está a fazer isto para se candidatar à câmara, para um cargo maior, ou a nível de Governo. Mas eu pu-los logo sossegadíssimos ao dizer que eu não queria ser mais nada além de presidente de junta, e só de Monte Abraão.
P. — Na política é tudo visto nessa perspectiva de protagonismo?
R. — Sim, ânsia de protagonismo. Muita gente pensou isso, e pessoas do meu partido, que era ânsia de protagonismo. O que eu respondia era que eu já tinha o protagonismo que merecia e que as pessoas achavam que eu merecia. Antes de isto acontecer eu já era conhecida por outras causas. Pelo trabalho feito aqui em Monte Abraão, inclusive.
P. — Numa câmara, tem mais competências, podia prestar mais serviço.
R. — Também já me têm dito isso. Mas não, a Câmara de Sintra para mim é um mundo e é também de mim conseguir controlar todas as situações. Eu aqui na freguesia gosto de saber sempre se na rua tal o buraco já está tapado, se o poste que caiu lá mais acima…

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